2008/07/13

NÃO É POR AÍ.




Depois dos eventos na Quinta da Fonte, Apelação, era com grande expectativa que se esperam declarações do Presidente da Câmara, sobre um problema que sistematicamente tem desvalorizado.

Não se esperavam grandes inovações de discurso, apenas que o Presidente da Câmara, condenasse, em primeiro lugar os actos cometidos, para de seguida anunciar medidas e acções de combate a este flagelo.

Em vez disso, fomos brindados com um conjunto de declarações dignas de um balcão de taberna, não só profundamente desconchavadas, como ofensivas, e impróprias de um Presidente de Câmara.

As comunidades que habitam aquele bairro foram o elo mais fraco de uma cadeia de interesses, visando a resolução de uma questão mais “nobre”, a construção da Expo 98 e dos acessos envolventes. Nesse processo, a planificação, estudo e avaliação dos impactos daquele realojamento em concreto, foram profundamente negligenciados, para não dizer inexistentes. O Estado criou as condições objectivas que hoje propiciam este tipo de acontecimentos nas Quintas da Fonte deste país. Existe uma responsabilidade pública inquestionável naquela situação.

Ignorando tudo isto, o Presidente da Câmara Municipal dispara “Já têm a sorte de lhes ter sido atribuída há alguns anos uma casa, onde pagam uma renda social muito baixa, e alguns até não a pagam...” Os habitantes daquele bairro de realojamento, ou de outro qualquer bairro de realojamento neste país, não “têm a sorte” de lhes ter sido atribuída uma casa. A casa não lhes saiu numa rifa! Os habitantes destes bairros de realojamento foram beneficiários de acções que resultam de políticas de habitação social definidas pelo governo em cumprimento do desiderato constitucional. O que se pode dizer é que as políticas de habitação social estão profundamente erradas, como facilmente se constata, mas elas são responsabilidade pública.

Mas estas declarações encerram também a marca do racismo social. Os habitantes pagarão uma “renda social muito baixa, e alguns até não a pagam”, afirma Carlos Teixeira. Não sei se as rendas são altas ou baixas, sei que variam de acordo com critérios que não foram os próprios que fixaram, subordinadas a regras de fiscalização que os próprios também não definiram. Se essas regras estão erradas ou não são justas, debatam-se democraticamente e alterem-se, mas não se faça recair o ónus desses erros sobre aqueles que mais são prejudicados por eles. O anátema lançado pelo Presidente da Câmara sobre os moradores dos bairros sociais é condenável. Mas há uma responsabilidade que pode ser assacada a muitos dos moradores destes bairros. É responsabilidade de se deixarem ludibriar por políticos desonestos e sem escrúpulos, que não hesitam em percorrer estes bairros nos períodos eleitorais, distribuindo rosas e tecendo loas, para mais à frente os tratarem com tamanho desdém.

Na Quinta da Fonte foi criada uma situação insustentável, perigosa para os seus habitantes. Foi criado um ambiente socialmente impróprio, onde ninguém de bom-senso gostaria de viver e criar os seus filhos. Muitos dos que têm condições para tal, têm abandonado o bairro, em especial as famílias que haviam adquirido as suas casas no modo cooperativo. Estes foram os primeiros “despejados” da Quinta da Fonte, aqueles que viram o seu sonho de uma casa condigna ser transformado num pesadelo, resultado de uma politica de habitação desastrada. Não recorreram a nenhum tribunal pedindo responsabilidades, mas deveriam ter tido a possibilidade de o fazer. Outros se seguirão se a situação se for agravando, muitas chaves o Presidente passará a ter de um bairro onde ninguém quer viver.

Queixa-se o Presidente da Câmara que “quando procuramos fazer algumas acções de despejo, temos os juízes a condenar a Câmara” e que quem “se quiserem ir embora, está disponíveis para se ir embora...”, mas os cidadãos deste país é que deviam pedir responsabilidades pela ineficácia das politicas de integração social, de habitação social e de segurança. Se existem acções de despejo que são contrariadas pelo tribunal é porque as leis existentes assim o determinam, mas o legislador não mora na Quinta da Fonte!

Os autores das cenas vistas por todos devem ser punidos e o apoio àqueles que só pretender ter uma vida tranquila e em paz, deve ser redobrado. O estado deve-lhes isso.

À Administração Central devem ser exigidas responsabilidades e acções concretas, que vão muito para lá da segurança. Nenhum dos moradores escolheu ser alojado em regime concentracionário. O erro deve ser reparado, porque não existe paliativo que o resolva, ou sequer minimize. Nenhum morador daquele bairro teve uma palavra a dizer sobre o futuro que lhe foi destinado. A Câmara Municipal deveria estar na linha da frente dessa exigência.

Neste momento é necessário bom-senso, clarividência, firmeza e decisão, mas não conversa de taberna para consumo populista. Não é por aí.

1 comentário:

Anónimo disse...

http://tomarpartido.blogs.sapo.pt/916224.html