2008/03/16

O HOMEM DAS LINHAS TORTAS





foto: R.C.


‘X’ marks the spot, diziam piratas e espiões. ‘M’ incriminava o assassino no filme de Murnau – M, Matou – e desvendava-o perante uma sociedade atemorizada. ‘X’ juntava-se a repórter e tínhamos o Repórter X, como criou Reinaldo Ferreira o seu pseudónimo literário e jornalístico.

Aventureiro e criativo, Repórter X inventou entrevistas (Conan Doyle e Mata Hari), fingiu-se correspondente na Rússia, embora nunca tenha carimbado o seu passaporte com o símbolo dos Sovietes. Num estilo Orsen Wellesiano escreveu um artigo descrevendo um incêndio terrível na Estefânia, um fogo posto resultado de um mal-entendido, não fazendo lembrar A Guerra dos Mundos, mas pelo menos o estilo começava a esculpir-se.

Um dos aspectos mais relevantes em Reinaldo Ferreira é ter sido um dos primeiros – o primeiro? – a introduzir a espionagem como tema da arte portuguesa. Este lado policial encontramo-lo em obras como “O homem que perdeu o cérebro” (ed. Rolim) ou no filme de Leitão de Barros “O homem dos olhos tortos”, recentemente restaurado e exibido pela Cinemateca Portuguesa. Ambos os trabalhos são produtos fantásticos que nos cativam pela criatividade e capacidade de trama – no sentido latino, tecer/ligar acontecimentos – histórias que nos conduzem para Lisboa desaparecida e misteriosa, personagens de sobrolho franzido e chapéu enfiado até ao nariz. Ou mais moderno, uma espécie de Blockbuster actual. Nada falta a estas duas obras, nem sequer um lado experimental que aproxima-se muito dos experimentalistas dos anos 50 ou 60. A estética arrojada e lançada para um caminho que só poderia conduzir a um lado genial e mítico. A medida temporal das palavras de Reinaldo Ferreira são controladas com precisão, uma ampulheta que impede a criação de novas palavras quando o último grão de areia passa no estreito canal.

Apenas existe uma lacuna em Reinaldo Ferreira: Leitores e espectadores. Podia sintetizar as duas obras acima citadas, mas como a narração seria feita com paixão e por certo desvendaria todo a história, prefiro que a procura e descoberta sejam individuais.

A sua vida é pouco conhecida, muitos mitos e histórias são contados, o seu percurso é efabulado como uma personagem ficcional e apenas um romance contaria a sua verdade.

“Reinaldo (de realidade) e Ferreira (de ficção)” nasceu em Lisboa em 1897 e morreu na mesma cidade em 1935.









3 comentários:

O MARQUÊS DA PRAIA E MONFORTE disse...

BENFICA – MARÍTIMO X... Repórter

O filme de Leitão de Barros nunca chegou a ser concluido. Foi um projecto falido do Lusitânia Filmes, creio mesmo que foi o fim desse projecto cinematográfico.
Em 86 José Nascimento rodou uma nova adaptação ao cinema do Reporter X, um filme ambicioso com um elenco de luxo, Joaquim de Almeida, Eunice Muñoz, Mário Viegas e Rui Reininho. O filme estreou em 87, porém acabou por ser considerado pela crítica como um mau filme.
Excelente texto.

Anónimo disse...

Boa tarde Marquês

Você arranjou um Secretário que não é brincadeira. Boa referência cultural.
Já tinha saudades de ver a cultura tratada neste blogue.

beijinhos

Paula

Anónimo disse...

Há muito tempo que não se falava de livros neste Palácio.